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Química Nova na Escola
Vol. 41 No2
Maio de 2019

Editorial

Sesquicentenário da Tabela Periódica de Mendeleev

 

Em 2019 são comemorados 150 anos da publicação da primeira Tabela Periódica dos elementos químicos por Dmitri Mendeleev (1834-1907). Para celebrar essa data, a ONU declarou 2019 como o Ano Internacional da Tabela Periódica (https://www.iypt2019.org/). Trata-se de uma ótima ocasião para se divulgar o conhecimento químico expresso pela Tabela e promover eventos que contribuam para popularizar a Química, como ocorreu no recente Ano Internacional da Química (2011). Embora o interesse seja motivado pelo número redondo do aniversário, é importante lembrar que a Tabela Periódica não foi criada em um dia específico. Um relato com características fantásticas, que pode ser encontrado em certas obras de divulgação da Química, conta que, em 17 de fevereiro de 1869, após um longo dia de trabalho tentando classificar os elementos químicos com o auxílio de cartões em que anotara seus símbolos e propriedades, Mendeleev adormeceu em sua mesa de trabalho. Sonhou então com a Tabela Periódica e, ao acordar, anotou-a imediatamente em um papel. Esse fantasioso relato não contribui para a compreensão do processo de construção da ciência. Em seu esforço para chegar a uma classificação, Mendeleev trabalhou durante anos na sistematização do conhecimento sobre os elementos químicos disponível em sua época, e seus esforços foram precedidos pelos de diversos outros estudiosos. É preciso também levar em consideração que a classificação periódica requer uma concepção de elemento químico que a torne possível – e isso passou pela definição de elemento como substância simples por Antoine Lavoisier (1743-1794) no final do século XVIII, e pela associação dessa ideia com o conceito de massas atômicas relativas, feita por John Dalton (1766-1844) no início do século seguinte. Também foi importante o desenvolvimento da pilha eletroquímica nessa época, o que possibilitou o isolamento de diversos elementos químicos. Já em 1820, Johannes Döbereiner (1780-1849) observou relações quantitativas entre as massas atômicas de tríades de elementos químicos com propriedades semelhantes (como cálcio, estrôncio e bário, por exemplo). Nas décadas seguintes, outros estudiosos propuseram formas de classificar os elementos químicos conhecidos levando em conta suas propriedades, entre os quais se pode citar Leopold Gmelin (1788-1853), William Odling (1829-1921), John Newlands (1837-1898), Alexandre Chancourtois (1820-1886) e Julius Lothar Meyer (1830-1895). Assim, a criação da Tabela Periódica pode constituir um bom exemplo para mostrar aos estudantes o caráter coletivo da ciência. Vale lembrar que Mendeleev desenvolveu seu trabalho na Universidade de São Petersburgo, o que exemplifica a fundamental importância das instituições universitárias para o desenvolvimento científico, tecnológico e cultural de uma nação.

Além disso, é relevante destacar, em contextos didáticos, que a história da Tabela Periódica não termina como um triunfo incontestável de Mendeleev. Diversas questões se apresentaram como desafios à classificação proposta, tais como as decorrentes da descoberta da radioatividade, de elementos que não se “encaixavam” na Tabela (como ocorreu com o argônio, até que fosse inserido um grupo inteiramente novo na Tabela), ou da dificuldade de classificar as então chamadas “terras raras”. Tais desafios foram sendo superados com as contribuições de muitos outros cientistas. Um ponto marcante foram as contribuições teóricas de Antonius van den Broek (1870-1926) e experimentais de Henry Moseley (1887-1915), com as quais o número atômico passou a substituir a massa atômica como critério para o ordenamento dos elementos na Tabela Periódica. É possível ilustrar, assim, como o conhecimento científico não surge pronto e acabado como grandes feitos dos “gênios”, mas está sujeito continuamente a críticas, elaborações e reformulações. Não resulta, portanto, de revelações em sonhos ou adivinhações inspiradas, mas do trabalho cotidiano, diligente e criativo de milhares de cientistas no mundo inteiro. Se compreenderem essa imagem, talvez nossos estudantes passem a ver a ciência como um campo de atuação profissional no qual eles também podem vir a atuar e a contribuir para o desenvolvimento da sociedade brasileira, ajudando a substituir a ignorância e a credulidade por pensamento crítico e autônomo.

Esperamos que o leitor encontre, nos artigos que constituem este número de Química Nova na Escola, outros motivos de inspiração para sua atuação profissional na educação básica ou superior. Reflexões sobre a necessária renovação na formação de professores de química podem ser encontradas em três artigos: “O Jornal da Química como etapa inicial de abordagem problematizadora: proposta para ensino e formação de professores” (p. 139); “Saberes docentes compartilhados durante o estágio supervisionado: uma experiência com licenciandos em Química” (p. 156); e “Interfaces disciplinares no ensino de ciências: uma perspectiva docente” (p. 200). Contribuições para a temática da educação inclusiva também estão presentes nos artigos “Ensino de Química e codocência: interdependência docente/tradutor e intérprete de Língua de Sinais” (p. 162) e “Compreensões sobre a cegueira e as atividades experimentais no ensino de Química: quais as relações possíveis?” (p. 190). Diferentes metodologias para o ensino de Química são propostas e analisadas nos artigos “Produção de sabão no assentamento rural Monte Alegre: aspectos didáticos, sociais e ambientais” (p. 124); “Construção de objetos de aprendizagem para o ensino de Química” (p. 133); e “O método de estudo de caso como alternativa para o ensino de Química: um olhar para o Ensino Médio noturno” (p. 171). O uso da linguagem científica por estudantes do Ensino Médio é investigado em “Aprendizagem dos conceitos de ácidos e bases em um estudo sobre a linguagem” (p. 179). A transposição do conhecimento científico para os livros didáticos de Química é o foco do artigo “O conhecimento escolar: um estudo do tema Diagrama de Linus Pauling em livros didáticos de Química – 1960/1970” (p. 148).

Que essa variedade de assuntos e abordagens seja proveitosa para todos nossos leitores!

Paulo Alves Porto
Salete Linhares Queiroz

Editores de QNEsc

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on-line ISSN 2175-2699
impreso ISSN 0104-8899
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