É lúdico ter um número especial sobre o lúdico
42! Se você já leu o Guia do Mochileiro das Galáxias, de Douglas Adams, vai entender por que começamos com esse número. Para o autor, esse número é a resposta a todas as questões fundamentais da vida, do universo e tudo o mais. E este número especial de Química Nova na Escola é formado por 42 artigos. Pronto. Já podemos parar de escrever o Editorial. Todas as respostas aos problemas do ensino de Química foram respondidas neste número especial. Acabou! A coincidência é algo tão interessante que nunca pode ser mera... Qual nada! O lúdico é um caminho, mas, que nos perdoe Adams, não o único e não traz todas as respostas. Bem que poderia, pois, convenhamos, seria mais lúdico. Mas, o mais importante está no fato de que este número especial foi além do que esperávamos. Dezenas de manuscritos submetidos por autores de todo o Brasil e, por consequência, um volume de trabalho também enorme por parte dos editores de QNEsc na perspectiva de buscar avaliadores que pudessem, de fato, contribuir com os trabalhos submetidos. Acho que Douglas Adams não esperava por isso. Mas, Química Nova na Escola foi atrás, não das respostas da vida, mas de fazer com que este número ao menos respondesse um cantinho ínfimo das questões que povoam o universo do ensino de Química. O lúdico em ensino de Química é uma área relativamente nova. Os primeiros trabalhos não esparsos, que começaram a considerar um referencial teórico, metodológico ou de ensino e aprendizagem, despontaram em meados do ano 2000. A partir daí, houve um crescimento vertiginoso, o que levou ao aumento do número de trabalhos em eventos, artigos em revistas (muitos deles em QNEsc), criação de um evento específico para a área (JALEQUIM) e uma revista especializada na temática (Ludus Scientiae). Atualmente, há mestres e doutores sendo formados nessa perspectiva em vários programas de pós-graduação brasileiros e – o que é mais interessante – em diferentes áreas do conhecimento, que vão desde a Química até a Sociologia e a Filosofia. Poderíamos dizer que o lúdico no ensino de Química é, atualmente, uma subárea do ensino de Química, quando consideramos que o principal evento brasileiro da área (ENEQ) já considera o lúdico como um tópico de submissão de trabalhos. Ele está lá, de mãos dadas com a experimentação, que, como sabemos, pode ser lúdica (experimentos que nãosão lúdicos nem são legais...). Mais recentemente, para o ENADE da licenciatura em Química, o lúdico também consta como um tópico de avaliação da formação de professores no Brasil. Algo que poderia parecer impensável há duas décadas. O crescimento da área é importante. Quanto mais pesquisadores produzem sobre o lúdico, mais ela cresce e apresenta caminhos diferentes e outrora não pensados. É possível observar, e este número especial é reflexo disso, o quanto a área se encontra diversificada, seja em termos de temáticas de pesquisa, seja em termos de propostas de jogos ou, ainda, de conteúdos de Química. Há trabalhos que se constituem em relatos de experiência, muitos deles aplicados ao Ensino Médio, o que mostra uma melhor inserção dos jogos nas salas de aula desse nível educacional; e há também trabalhos de pesquisa, com metodologias sólidas e referenciais teóricos adequados, que apontam para uma necessária diversificação em termos de desenvolvimento da seara do lúdico no ensino de Química. São 18 os artigos de pesquisa deste número especial. Sete deles sobre formação de professores, tanto no que se refere a atividades lúdicas para licenciados, quanto discussões epistemológicas e curriculares, o que nos parece um caminho importante quando consideramos que o lúdico é uma temática do ENADE. Cinco apresentam discussões relacionadas ao RPG ou atividades similares na perspectiva da discussão da representação e simbologia dentro do jogo. Outros três artigos apresentam relações entre o jogo e a história da química, além da perspectiva do lúdico na contação de histórias – duas vertentes pouco exploradas na literatura e interessantes para serem discutidas pelos pesquisadores do lúdico. Enfim, como não poderia faltar, três artigos sobre jogos digitais e virtuais, explorando desde um estudo cienciométrico até a análise de um jogo de videogame. Quanto aos relatos de experiência, temos 24 artigos. Quatro deles sobre formação de professores e aplicações de jogos para estudantes de nível superior, novamente ratificando um direcionamento importante das pesquisas sobre o lúdico. Tivemos quatro artigos sobre educação ambiental, abrangendo temas como Química Verde e educação ambiental crítica. Outros cinco trabalhos consideram a atividade efetiva dos estudantes, por meio de estudo de caso, caça aotesouro, esquetes teatrais e dramatizações, diversificando o uso de cartas e tabuleiros, que são jogos analógicos presentes na cultura lúdica brasileira. Mais seis artigos abordam jogos virtuais e digitais. A série de relatos de experiência fecha esta edição com proposições de jogos analógicos de cartas e de tabuleiros para o ensino de diversos conceitos químicos na Educação Básica, propostas tradicionais na área e não menos importantes. Tanto no que se refere a pesquisas, quanto a relatos de experiência, este número é rico em temáticas e conteúdos. Foram explorados temas como a Tabela Periódica, que é um conteúdo campeão em todos estes anos de ludicidade no Brasil e parece imortal e inesgotável, ácidos e bases, radioatividade, divulgação científica, energia, separação de misturas, nutrientes, segurança no laboratório, poluição,intoxicação, mulheres na Ciência, relações étnico-raciais e de gênero, inclusão, entre outras várias interrelações. O lúdico no ensino de Química pode ser um caminho, sendo aberto e trilhado por vários pesquisadores e pesquisadoras. Mas, pode também ser um estado, no qual pesquisadores(as) de outras searas se aventuram com alguns trabalhos. Caminho ou estado, é melhor você ler os artigos desse número. Vai que alguém descobre para que serve o universo e ele desaparece, como diria Adams. Daí, você pode não ter lido esse número. Melhor não perder. E não se esqueça de sua toalha! Boa leitura!
Márlon Herbert Flora Barbosa Soares
Editor Convidado