Precisa-se de professores de Química
Recente artigo1 aponta para o problema da falta de professores de Química... na Europa. Pesquisa da Royal Society of Chemistry, do Reino Unido, revelou que 30% das escolas públicas de Ensino Médio daquele país não têm professores de Química em número suficiente. Uma das causas para a insuficiência de professores são as perspectivas salariais: embora o salário inicial seja competitivo, em apenas cinco anos os profissionais atingem o teto de ganhos – o que os leva a buscarem alternativas no mercado de trabalho. Outras razões para a evasão de professores da carreira no Reino Unido são a carga de trabalho, estresse, ansiedade, exaustão e o sentimento de não serem valorizados. Associado a esses problemas está o insuficiente financiamento das escolas, que as leva a colocar mais alunos em cada sala de aula. Mas os problemas não estão restritos ao Reino Unido: na Suécia, menos de 11% dos professores acreditam que sua profissão é valorizada pela sociedade, e a docência é considerada pouco atrativa pelos jovens em função de elevada carga de trabalho e salários relativamente baixos. Na Alemanha, a situação é um pouco melhor porque os professores têm estabilidade no emprego (semelhante ao que seria um professor concursado no Brasil), mas ainda assim existem dados preocupantes que projetam a falta de professores de Química já em 2030, sendo uma das causas o envelhecimento do corpo docente. Na Áustria e no Reino Unido, uma das “soluções” encontradas para o problema tem sido atribuir aulas de Química para professores formados em outras disciplinas – até mesmo História ou língua nacional –, muitas vezes sem que lhes seja dada a necessária formação complementar. As consequências não são difíceis de imaginar: sem o devido conhecimento da disciplina, os professores não conseguem despertar o interesse dos estudantes pela Química. Tudo isso foi observado na Europa, mas quem se dedica ao ensino de Química no Brasil deve concordar que esses problemas são comuns também a nosso país. A escassez de professores gera um círculo vicioso: menos aulas de Química gera menor interesse dos estudantes, que não verão a Química e seu magistério como opções profissionais – resultando em menor número de professores de Química no futuro. As implicações vão além, considerando- -se o papel central do conhecimento químico em quaisquer cursos superiores que envolvem transformações de materiais e fenômenos biológicos, incluindo as engenharias e a área da saúde. A ausência da Química na Educação Básica requer que os cursos superiores sejam repensados para supri-la. Claro que a pequena atratividade da profissão docente no Brasil afeta todas as disciplinas, e não somente a Química. Tendo isso em vista, o Governo Federal anunciou em janeiro o programa “Mais Professores para o Brasil”, que inclui diversas medidas, entre as quais o chamado “Pé-de-meia Licenciaturas” – que vai oferecer bolsas para estudantes de Licenciaturas. Embora qualquer iniciativa que contribua para a permanência estudantil nos cursos universitários seja bem-vinda, dificilmente isso terá o impacto desejado, pois não atinge os problemas estruturais. Sem concursos públicos regulares e planos de carreira atraentes nas redes estaduais e municipais (sendo que algumas sequer pagam o piso salarial atualmente), sem condições adequadas de trabalho e de formação continuada, dificilmente os professores recém-formados permanecerão por muito tempo no magistério. Porém, mudanças estruturais requerem que a população brasileira compreenda a natureza dos problemas. Cumprindo com sua finalidade, este número de Química Nova na Escola traz, mais uma vez, suas contribuições para a educação química. Se algumas políticas públicas parecem estar mal orientadas, diversos trabalhos publicados em QNEsc ao longo do tempo têm mostrado que o PIBID, por outro lado, cumpre o seu papel. Neste número, reflexões sobre esse bem sucedido programa são apresentadas no artigo “O desenvolvimento profissional docente em Química no contexto do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência”. Diferentes metodologias inovadoras para o ensino de Química estão presentes em outros artigos, como o leitor poderá ver em “#Nanoteam: o ensino da nanociência por meio do método Jigsaw e da Atividade Experimental Problematizada (AEP)”. Um relato inspirador sobre atividades interdisciplinares é oferecido no artigo intitulado “Fotografia como eixo integrador de Arte, Química e Física: desenvolvimento e contribuições do projeto ‘Ciência da Fotografia’ na construção do protagonismo e conhecimento científico em estudantes do ensino médio”. O ensino de um conteúdo muitas vezes desafiador para os estudantes pode se beneficiar da abordagem descrita em “Avaliação da metodologia peer instruction no aprendizado de termodinâmica na graduação em Química”. Também o ensino de conteúdos de Química Orgânica recebe uma contribuição, na forma do artigo “Reflexões de práticas docentes no contexto do estágio supervisionado envolvendo ensino de funções orgânicas oxigenadas”. A contextualização do ensino por meio da História da Ciência igualmente está presente neste número, que traz o caso intitulado “A expansão industrial química europeia: os processos Leblanc e Solvay”. Na seção Cadernos de Pesquisa temos dois artigos, aprofundando duas temáticas de relevo na atualidade – a divulgação científica e a etnoquímica – respectivamente nos artigos “Uma revisão bibliográfica sobre a divulgação científica em eventos da área de Ensino de Química” e “A Etnoquímica na produção de cerâmica tradicional: interseções entre Saberes Ancestrais e a Química Moderna”. Após o grande sucesso do número especial sobre Ludicidade no Ensino de Química, esperamos que a leitura desta edição também seja muito proveitosa para toda a comunidade de educadores em Química!
Paulo Alves Porto 
Instituto de Química, Universidade de São Paulo (USP)
São Paulo-SP, Brasil
Salete Linhares Queiroz 
Instituto de Química de São Carlos, Universidade de São Paulo (USP)
São Carlos-SP, Brasil
Editores de QNEsc
Referência
1. Zainzinger, V. Is Europe running out of Chemistry teachers? ACS Central Science, article asap, 2025. Disponível em: https:// pubs.acs.org/doi/10.1021/acscentsci.5c00038, acesso em jan. 2025.