“Pátria Educadora” dá lugar a “Ordem e Progresso”
A campanha que prometia acabar com a corrupção no Brasil já gerou um resultado concreto: o afastamento da presidente eleita pelo voto direto. Aguardemos a restauração da moralidade no trato da coisa pública que – a acreditar nos manifestantes que tomaram para si as cores verde e amarela – sempre existiu no Brasil e somente foi interrompida nos últimos anos. Neste momento, temos um governo que supostamente seria provisório, até o julgamento final pelo Senado. Seu comportamento, no entanto, com o desmonte de toda a estrutura do governo afastado, revela que a sentença já é conhecida e que o julgamento em curso no Senado só pode ter um resultado. A salvação nacional aparentemente passa pela redução do déficit público, e o governo provisório tratou de extinguir ministérios, ainda que a economia disso para as contas públicas seja apenas simbólica. Maior simbologia, entretanto, reside nas pastas escolhidas para o corte: foram extintos, entre outros, o Ministério das Mulheres; da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos; o da Ciência, Tecnologia e Inovação (agora unificado ao Ministério das Comunicações); e o da Cultura – este foi recriado poucos dias depois, após intensa campanha promovida por representantes e entidades dos meios artístico e cultural repercutida pela mídia. O meio científico também se manifestou contra a incorporação da C&T ao Ministério das Comunicações, mas nesse caso, pouca repercussão houve na mídia. A Previdência Social passa a ser subordinada ao Ministério da Fazenda, não mais ao do Trabalho. O governo provisório também já deixou claro que pretende economizar nas áreas de Saúde e Educação. O próprio ministro provisório da Saúde declarou que o Brasil não tem como garantir os direitos previstos na Constituição Federal como o acesso universal ao sistema público de saúde. O ministro provisório da educação montou sua equipe com nomes ligados à educação privada e defensores do Estado mínimo. Resta-nos esperar que a prometida eficiência nos gastos públicos não seja, de fato, apenas um discurso destinado a ocultar cortes de verbas para áreas prioritárias como a Educação.
Em meio à turbulência política, os educadores seguem sua jornada. Neste número de Química Nova na Escola, tendências atuais do ensino de ciências são objeto de discussões, aprofundamentos e análises sob vieses variados. A interdisciplinaridade é abordada em quatro artigos, abrangendo aspectos bastante distintos: sua presença nas questões do ENEM (Abordagem da química no Novo ENEM: uma análise acerca da interdisciplinaridade); possibilidades de diálogo entre literatura
e química (Anotações a Experimentação e literatura: contribuições para a formação de professores de química);possibilidades para a formação de professores (Análise de alimentos: contextualização e interdisciplinaridade em cursos de formação continuada); além de um artigo especial do Prof. Attico Chassot, que discute concepções acerca da transgressão das fronteiras disciplinares (Do rigor cartesiano disciplinar à indisciplinaridade feyerabendiana). As potencialidades e os usos dos recursos multimídia são abordados em dois artigos, um dos quais faz uma revisão acerca das novas tecnologias no ensino de química (Uso de softwares educacionais, objetos de aprendizagem e simulações no ensino de química), enquanto o outro propõe o uso desses recursos em um contexto investigativo (Ensino de modelos para o átomo por meio de recursos multimídia em uma abordagem investigativa). A abordagem investigativa também se faz presente em outro artigo, no qual são propostas atividades experimentais para a solução de um problema simulado em sala de aula (A ciência forense no ensino de química através da experimentação investigativa e lúdica). Outra estratégia que tem sido objeto de discussões teóricas e propostas de ação em tempos recentes em nossa área é a que envolve estudos de caso. Nesta edição de QNEsc, uma proposta de utilização dessa estratégia para a formação docente é focalizada no artigo Análise de uma estratégia de estudo de caso vivenciada por licenciandos de química. Também inovador é o enfoque do artigo que trata de um dos mais bem-sucedidos programas de formação de professores desenvolvidos no país nos últimos anos, o PIBID: os autores buscaram investigar seu impacto do ponto de vista de alunos do ensino médio que participaram de aulas e atividades desenvolvidas no âmbito desse programa (A influência do PIBID/Química da UFRGS sobre o desempenho escolar de alunos de ensino médio). Como é característico de nossa revista, marcam presença também artigos que trazem reflexões e sugestões para o ensino, tanto sob perspectivas teóricas quanto experimentais, de conteúdos químicos específicos – tais como a isomeria óptica (Desenhando isômeros ópticos) e a espectrofotometria (Espectrofotometria no ensino médio: construção de um fotômetro de baixo custo e fácil aquisição). Destaca-se, ainda nesse contexto, o artigo da seção Cadernos de Pesquisa, que apresenta uma revisão sobre o ensino de ácidos e bases (Revisão no campo: o processo de ensino-aprendizagem dos conceitos ácido e base entre 1980 e 2014).
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Desejamos a todo o nosso público uma agradável e proveitosa leitura.
Paulo Alves Porto
Salete Linhares Queiroz